quarta-feira, 22 de junho de 2011

Ternos, togas e cegueiras

Reproduzindo os devaneios formalistas, já típicos do nosso tão mal-tratado Direito, o Conselho Nacional de Justiça determinou que os advogados do Rio de Janeiro deveriam respeitar o código de vestimenta imposto pelos tribunais e se apresentar sempre às cortes trajando terno e gravata. A Ordem do Advogados do Brasil, no Rio, havia permitido aos advogados que se apresentassem em juízo com roupas um pouco mais condizentes com o clima local no verão. Contudo, das suas salas climatizadas em Brasília, o CNJ deu aos tribunais a liberdade de impedir a presença de advogados fora do esquema terno-e-gravata.

Os conselheiros, supostamente, assim decidiram para proteger o decoro e as normas de conduta dentro dos tribunais. Questiono onde está essa preocupação quando as imoralidades cotidianas ocorrem entre as paredes da Justiça. Onde está o decoro quando direitos individuais são negociados como mercadoria? Que moral é essa que se dá como agredida pela ausência de nossas coleiras de seda, mas não enrubesce diante de sentenças marcadas pelo ódio, pelo preconceito e pela ignorância?

Não há mais que se falar em boa conduta dentro dos nossos tribunais quando o único respeito reservado a nós é o medo da autoritária figura do juiz, quando a legitimidade de nossas decisões está menos na consciência das pessoas que nos braços das forças policiais.

Senhores conselheiros, o que agride a moral de nossa Justiça não são esses advogados que afrouxam suas gravatas diante de míseros 40 graus. O que agride nossa moral são as formalidades opressoras, de togas e ternos, a mentalidade elitista, enfim, os arroubos megalomaníacos e esquizofrênicos que expulsam das salas de audiências advogados sem ternos de seda ou agricultores de chinelos. O que mancha a justiça é sua constante cegueira ao mundo real.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Justiça Romana, Igreja Romana, problema brasileiro

Palavras são vazias até que lhes damos significado. Construímos nossos conceitos quanto ligamos certas palavras a certas ideias. Isso pode parecer pouco importante de se ter em mente, mas esquecer que uma palavra tem um significado determinado historica e socialmente, pode abrir caminho pra alguns mal-entendidos ou talvez sustentar argumentações até maliciosas. Usar conceitos em desalinho com a realidade é algo comum e bem prejudicial.

Quinta-feira passada, dia 12 de maio, Eduardo Peters, coordenador da Comissão de Bioética da Arquidiocese de Brasília, foi convidado a expressar as razões da Igreja Católica contra a decisão do STF de reconhecer direitos iguais para diferentes expressões de afetividade. Um dos suportes de sua argumentação era a definição de justiça do jurista romano Ulpiano, que dentre outras coisas definiu o justo como "dar a cada um o que é seu" (suum cuique tribuere). Dai que seria injusto igualar a União homoafetiva e o casamento heterossexual, já que o "seu" - convenientemente esquecendo que esse "seu" é socialmente determinado, e não natural - de cada um seria diverso.

Já se falou muito sobre as falhas dessa forma de justiça - aos oprimidos opressão, aos excluídos a exclusão, a cada um o que é seu - mas é preciso entender que não é o conceito em si que está errado. Ele simplesmente existe pra uma outra realidade, com outras formas de agir e pensar, com papéis sociais diferente e normas sociais diferentes. Então, senhor Eduardo, o senhor não falou nada errado. Só não vale achar que o justo de 1.800 anos atrás é, automaticamente, o justo de hoje.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

A revolução não será no sofá

Não tem jeito, não consigo acreditar em "twittaços". Na verdade, eu acho difícil, e até um pouco ingênuo, ter fé no poder emancipador das mídias socias que algumas pessoas têm. Dá a impressão de que se no passado se falava em Guevara, Martín e Bolívar, os libertadores do novo século se chamam Twitter e Facebook.

Exageros à parte, não dá pra negar a importância das redes sociais nas revoluções, na corrosão do autoritarismo, mas não dá pra esquecer também que elas são ferramentas de mobilização. A informação pura não liberta os povos. A verdade, por si só, não vos libertará. Se, por exemplo, o facebook teve grande importância nas convulsões recentes em países muçulmanos, o que forjou a revolução, de verdade, foi o povo na rua. Apesar da importância do ciberespaço, o lugar das revoluções ainda é a rua. Facebook no Egito, blogs no Irã, twitter na Líbia - a palavra livre é fundamental para a democracia, mas ela ganha corpo é na luta física, real, nos choques contra o Estado autoritário.

Por isso não acredito em twittaços. Se me permito recuar em sua defesa é que eles cumprem parte do papel de uma manifestação real: publicizar a insatisfação. Eles ao menos servem pra deixar claro pros governantes que as pessoas não estão felizes com a situação. E pra que as pessoas saibam que não estão sozinhas nas suas demandas. É um passo além do tradicional resmungar em volta das garrafas de café e bebedouros de escritório. Mas protestar é algo mais que isso. Quando o povo vai às ruas, não é só uma demonstração de reprovação, mas também um aviso para aqueles que governam, lembrando-os que eles governam como representantes do povo, esse sim a verdadeira fonte do poder público.

Explodir em hashtags furiosas pelo twitter é sim um bom meio de espalhar o debate, mobilizar as pessoas, mas sem que haja uma disposição de fazer valer a soberania popular, de nada vão adiantar as ferramentas tecnológicas disponíveis. Que dirá o Sr. José Sarney, orgulhoso presidente do Senado.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Viver é uma necessidade

Não estava pensando em fazer promessas de ano-novo. Não acredito nelas porque tenho a impressão de que as pessoas as fazem só pra esquecê-las antes da páscoa. E também porque no fundo eu sei que não preciso prometer. O que eu tenho que fazer e mudar está bem claro, e quase um dever. Sempre me orgulhei de ser consciente dos meus erros e falhas, mas ano passado percebi que talvez eu não esteja assim tão a par da minha fraqueza.

Então, se for preciso escolher uma resolução de ano-novo, eu escolho esta: serei mais humilde, mais sincero com minhas limitações e farei o possível para ser o mais próximo que eu puder do que acredito ser uma pessoa "boa". Vou mesmo correr atrás e tentar aderir a uma vida livre de remorsos e segundas intenções.