quarta-feira, 22 de junho de 2011

Ternos, togas e cegueiras

Reproduzindo os devaneios formalistas, já típicos do nosso tão mal-tratado Direito, o Conselho Nacional de Justiça determinou que os advogados do Rio de Janeiro deveriam respeitar o código de vestimenta imposto pelos tribunais e se apresentar sempre às cortes trajando terno e gravata. A Ordem do Advogados do Brasil, no Rio, havia permitido aos advogados que se apresentassem em juízo com roupas um pouco mais condizentes com o clima local no verão. Contudo, das suas salas climatizadas em Brasília, o CNJ deu aos tribunais a liberdade de impedir a presença de advogados fora do esquema terno-e-gravata.

Os conselheiros, supostamente, assim decidiram para proteger o decoro e as normas de conduta dentro dos tribunais. Questiono onde está essa preocupação quando as imoralidades cotidianas ocorrem entre as paredes da Justiça. Onde está o decoro quando direitos individuais são negociados como mercadoria? Que moral é essa que se dá como agredida pela ausência de nossas coleiras de seda, mas não enrubesce diante de sentenças marcadas pelo ódio, pelo preconceito e pela ignorância?

Não há mais que se falar em boa conduta dentro dos nossos tribunais quando o único respeito reservado a nós é o medo da autoritária figura do juiz, quando a legitimidade de nossas decisões está menos na consciência das pessoas que nos braços das forças policiais.

Senhores conselheiros, o que agride a moral de nossa Justiça não são esses advogados que afrouxam suas gravatas diante de míseros 40 graus. O que agride nossa moral são as formalidades opressoras, de togas e ternos, a mentalidade elitista, enfim, os arroubos megalomaníacos e esquizofrênicos que expulsam das salas de audiências advogados sem ternos de seda ou agricultores de chinelos. O que mancha a justiça é sua constante cegueira ao mundo real.

4 comentários:

Rábula disse...

É simples, não estamos na Europa. Aqui vivemos sob os míseros 40 graus. Lá se justifica o uso do terno. Aqui não. Não adianta querermos importar todos os hábitos de lá.

Thiago Rodrigues disse...

Sei nem por onde começar a te elogiar pelo texto!!! Incrível mesmo, bom de ler, bom de ver, bom de ir descobrindo que tem gente (ainda que muiiito diferente de mim) pensa com uma racionalidade mínima pra ver o quanto tem coisa errada nesse mundo, o quanto tem gente errada nesse mundo!!
As vezes fico pensando que se cada um tivesse um mínimo de bom senso para com o outro o mundo seria sei lá ... um lugar mais decente, sabe??
Nunca entendi o por que de usarmos gravatas, nem nunca entenderei, é o típo de coisa que só incomoda (e incomoda a todos),e só serve pra embelezar. Ok, quer ficar bonito, usa, mas não obriga ninguém a usar!! Não cria um padrão (e por trás desse padrão deformado, podemos pensar em quantos outros padrões deturpados temos que conviver)pra isso e diz que só tá certo quem o segue porque isso além de ser ridículo é sei lá imoral!!!

Chegará o dia que a gravata será extinta do mundo e vista com os maus olhos que a ela cabem!! Que chegue logo esse dia e chegue também o dia em que os outros padrões, e as outras coisas idiotas a que somos submetidos sumam de nossas frentes e de nosso cotidiano!!

Enfim Parabéns pelo texto brow!!

PS: confessar aqui que tive dificuldade em escrever isso aqui diante do ódio que esse assunto me deu (táquiopariu, bando de idiotas, grrrr)!!

Abraço

Lecram disse...

"O que me preocupa não é grito dos maus, é o silêncio dos bons." - Martin Luther King

Ilana Kenne disse...

Deve ser fácil usar terno passando o dia numa sala com ar condicionado e, na hora de ir embora, ter um motorista num super carro com arzinho gelado. Quero ver passar o dia no fórum batendo perna num calor de 35º...